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Aquicultura Multitrófica Integrada em bioflocos: unindo produtividade e sustentabilidade

Felipe Boéchat Vieira

Walter Quadros Seiffert

Camarão marinho produzido em bioflocos. Figura1.
Camarão marinho produzido em bioflocos. Figura1.

O Laboratório de Camarões Marinhos (LCM) da Universidade Federal de Santa Catarina trabalha há 40 anos com o desenvolvimento de tecnologias para a reprodução e cultivo de camarões marinhos. Buscando a sustentabilidade dos cultivos, há cerca de 20 anos, o LCM iniciou pesquisas com o cultivo de camarões em sistema de bioflocos microbianos (Figura 1). O sistema de bioflocos se caracteriza pela grande produtividade e baixa renovação de água, o que permite uma alta produção de camarões em pequenas áreas. Nesse sistema, os nutrientes gerados pelo cultivo são reciclados por uma complexa comunidade microbiana, formando os bioflocos - que são uma fonte alternativa de alimento para os camarões. A alta produtividade associada ao baixo uso de água resulta em um uso aproximado de 400 L de água para produzir um quilograma de camarão, valor muito inferior ao sistema convencional - que é de cerca de 90.000 L de água para produzir o mesmo quilograma de camarão. Sendo assim, por si só, o sistema de bioflocos já é um sistema mais sustentável de cultivo de camarões. 

Sistema integrado para produção de camarões, tainhas e microalgas em flocos. Figura 2.
Sistema integrado para produção de camarões, tainhas e microalgas em flocos. Figura 2.

Buscando aumentar ainda mais a sustentabilidade, foram iniciadas no LCM pesquisas para integração de outras espécies ao sistema, a chamada Aquicultura Multitrófica Integrada (AMTI). No AMTI, os resíduos gerados por uma espécie são usados como alimentos e/ou fertilizantes para outras, aumentando a eficiência do sistema e diminuindo a geração de efluentes. O sistema usa espécies de diferentes níveis tróficos, como camarões, peixes, macroalgas e plantas (Figura 2).



Duas espécies de peixes muito conhecidas pelos catarinenses - a tilápia (Figura 3) e a tainha (Figura 4) - vêm sendo estudadas no LCM. Em ambos os casos, os peixes consomem os nutrientes orgânicos provenientes do cultivo dos camarões, aumentando a eficiência. Com a integração dos peixes ao cultivo, temos um aumento da produtividade, e assim, o aumento da biomassa produzida usando quase a mesma quantidade de ração. Ainda, se diversifica a produção com espécies de valor comercial já conhecidas e apreciadas pelos consumidores.



As espécies fotossintetizantes, como macroalgas e plantas, têm um papel chave no AMTI ao fixar carbono e outros nutrientes em biomassa verde, diminuindo assim a pegada de carbono do cultivo. A primeira espécie vegetal integrada no sistema foi a salicórnia (Figura 5), uma planta halófitas, o que significa que tem alta tolerância ao sal e assim pode ser irrigada com água salgada. Provenientes do mangue da Daniela em Florianópolis, a salicórnia pode ser cultivada com os nutrientes inorgânicos do cultivo de camarão, tanto em canteiros diretamente na terra quanto em sistema de aquaponia. Nos primeiros trabalhos no LCM, foi demonstrado que ao ser integrada ao cultivo de camarões em aquaponia, a biomassa produzida de salicórnia chega a ser duas vezes superior à de camarões. A salicórnia pode ser usada em diversos pratos e preparações culinárias, incluindo cervejas. A Lohn Bier em colaboração com a Biorta criou a Gose Salicórnia, com plantas produzidas no LCM (Figura 6). Outra planta que vem sendo estudada com resultados promissores é o alecrim-do-mar (Figura 7). Planta nativa do nordeste do Brasil, o alecrim-do-mar tem um delicado sabor salgado, muito apreciado na culinária (Figura 8). Outra espécie estudada é alface-do-mar (Figura 9). Essa macroalga possui grande crescimento, chegando a triplicar a sua biomassa, semanalmente, ao ser integrada ao cultivo de camarões. Ela tem grande potencial de uso, tanto na indústria farmacêutica, quanto na cosmética e na culinária. As plantas e macroalgas produzidas no LCM já fazem parte do menu de restaurantes, como o Capincho, em Porto Alegre (Figura 10).



Reunindo os resultados de mais de 10 anos de pesquisa, a cerca de dois anos foi implementada no LCM uma unidade didática para produção integrada de camarões, peixes, plantas e macroalgas em bioflocos em escala piloto-comercial. A unidade - uma estufa de 900 m2 - possui 8 tanques de 50.000 litros para produção de camarões, 8 tanques de 5.000 litros para produção de peixes, 2 tanques de 4 mil litros para produção de macroalgas e canteiros externos para produção de salicórnia e alecrim-do-mar. A estufa é dotada de um sistema de geração de energia solar e captação de água da chuva. Sendo assim, é uma unidade altamente sustentável, onde é possível a produção de uma grande biomassa de espécies de interesse para alimentação com baixo impacto ambiental, combinando um sistema de produção eficiente com energias limpas. 

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